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Clippings - 08/06/22

Navios podem esperar até 30 dias para desembarque de fertilizantes em Paranaguá

Arquivo/Divulgação

Cerca 670 mil toneladas desses insumos agrícolas estavam à espera do desembarque, até segunda-feira (6). Estoques em armazéns privados estão no limite da capacidade, girando em aproximadamente 3,5 milhões de toneladas.

A guerra entre Rússia e Ucrânia desencadeou muita especulação e correria no agronegócio, relacionadas a um possível desabastecimento de fertilizantes para o mercado agrícola nacional, considerando que esses dois países são importantes players de exportação de adubos para o Brasil. Em ritmo lento, as compras antecipadas – comuns no setor por conta dos planejamentos das safras – chegaram em um volume acima do esperado, causando um entrave no principal portão de entrada desses produtos no país: o Porto de Paranaguá, no Estado do Paraná.

Cerca de 670 mil toneladas estavam paradas em navios, na última segunda-feira (6 de junho), à espera do desembarque e 3,5 milhões estocadas em armazéns de retaguarda privados, localizados nas imediações do terminal portuário. As mercadorias ainda aguardam pelas retiradas por parte de seus compradores que, em geral, são empresas importadoras. A maior parte dos fertilizantes será transportada pelo sistema rodoviário de cargas e, em menor escala, pelo modal ferroviário até seus respectivos destinos. A quantidade estocada, atualmente, corresponde a quase o limite máximo da capacidade de armazenagem.

“Hoje (7), nós temos cinco navios atracados, 16 ao largo (aguardando para atracar, mas já posicionados nas proximidades em alto mar) e oito são esperados (já agendados) para os próximos 20 dias, o que equivale a cerca de 670 mil toneladas de fertilizantes. Isso tudo se deve à antecipação das compras, daí essa demanda represada”, informou Luiz Teixeira da Silva, diretor de Operações da Portos do Paraná, empresa responsável pela administração do Porto de Paranaguá.

Conforme o gestor, o tempo normal de espera era de, no máximo, dez dias para os berços mais demandados. Agora, pode chegar a um mês. “Quando se diz que a espera pode chegar a 30 dias, não quer dizer que todo navio espera esse tempo. Tem navio, por exemplo, que chega e já atraca para descarregar. Isso também depende da documentação, do destino da carga, do berço a ser ocupado, entre outros fatores”.

Como a operação no Porto de Paranaguá funciona 24 horas, até o fechamento desta reportagem, os navios com fertilizantes tinham como origem o Marrocos, Rússia, Ucrânia, China, Estados Unidos, Austrália, Qatar, Canadá e Egito.

Demanda represada
De acordo com Teixeira, “a capacidade de armazenagem é de aproximadamente 3,5 milhões de toneladas em armazéns privados, fora do porto organizado, e contratados diretamente pelo importador”.“Desde outubro do ano passado, nós passamos a ter uma demanda fora do habitual e isso fez com que houvesse um represamento, cujos reflexos duram até hoje. Mas chegamos a ter até 40 navios esperando para descarregar.”

Segundo o diretor de operações, a atual demora para o desembarque dos fertilizantes se deve ao fato de ter “pouco espaço de armazenagem para colocar o que sai do navio”. “Não estamos parados. O Porto de Paranaguá está descarregando em ritmo mais lento, mas continua descarregando”. Ele reforçou que, “dentro da normalidade, seria o navio chegar com os fertilizantes, dar ok na documentação e atracar, mas hoje eles têm de esperar algum tempo”.

Compras antecipadas acendem alerta para déficit de armazenagem
O Brasil importa 85% dos fertilizantes consumidos anualmente, sendo que apenas 23% desses insumos vieram da Rússia, no ano passado. Em cenários anteriores ao conflito entre russos e ucranianos, os desembarques não eram um problema. O que fica evidente é a incapacidade de armazenagem desses insumos no país, que não podem ser estocados com outros tipos de produtos agrícolas.

“Dois terços dos adubos são consumidos no Brasil na segunda metade do ano. Agora, esse comportamento das compras antecipadas já vem ocorrendo há vários anos, conforme os produtores rurais vêm planejando, cada vez mais cedo, suas safras. A maior parte dessa compra foi feita por grandes players do nosso país, antes da disparada do conflito entre Rússia e Ucrânia”, informou o especialista em agronegócios Carlos Cogo, sócio-diretor da Cogo Inteligência em Agronegócio.

Ele citou que, entre janeiro e maio de 2022, as importações totais de fertilizantes cresceram 13% em volume, na comparação com igual período do ano passado. “É importante mencionar que, mesmo diante dessa alta das importações no acumulado do ano, os fertilizantes não foram incluídos na lista de sanções impostas à Rússia pelos Estados Unidos e União Europeia. Os embarques russos para o Brasil, embora abaixo do normal, estão acontecendo. Então, os riscos de desabastecimento reduziram substancialmente”, afirmou Congo.

Na opinião do consultor em agronegócios, além do problema da capacidade reduzida para armazenar milhões de toneladas de fertilizantes, “a situação dos portos brasileiros é complicada, pois passa por outras questões como preços do frete, alta do diesel e ameaça no desabastecimento do combustível, movimento dos caminhoneiros, entre outros cenários”.

“Está havendo maior pulverização de entrada de produtos no Brasil por outros portos, mesmo que ainda não seja no grau desejado. Isso já começa a acontecer, embora saibamos que a maior dos fertilizantes seja direcionada a terminais portuários com estrutura específica para esse tipo de produto, como é o caso do Porto de Paranaguá”, ressaltou Cogo.

Produtores rurais
Professor do Ibmec e diretor da Sociedade Nacional de Agricultura (SNA), o economista Márcio Sette Fortes disse que, de fato, “a antecipação de compras de fertilizantes chegou a tomar forma, por parte de alguns produtores rurais, e foi discutida por muitos outros como solução que poderia amenizar eventuais impactos da escassez desses insumos no país”. No entanto, as transações de importações acabaram sendo feitas pelas empresas importadoras e, agora, os agricultores aguardam por preços melhores para comprar esses insumos.

“A antecipação implica em desencaixes financeiros descasados com o faturamento, além do que a própria escassez desses insumos já implicava em aquisições por demais onerosas, em função das cotações que já se encontravam altas, antes mesmo da guerra”, comentou o especialista.

Na visão de Thomaz Britze, conselheiro da empresa de fusões e aquisições Hand M&A, como o Brasil importa 85% dos fertilizantes, sendo a Rússia e Ucrânia importantes players, a guerra entre as duas nações pode ter algum impacto no abastecimento para os produtores daqui.

“Nosso país foi bastante ativo ao procurar por outros países fornecedores de fertilizantes. Mesmo assim, acredito que terá impactos, mas não de forma catastrófica. O que deve ter é outro impacto para o produtor: o aumento significativo dos preços das matérias primas desses insumos, atingindo novos patamares”, analisou.

Custos produtivos
Segundo o economista e diretor da SNA Marcio Sette Fortes, os gastos dos agricultores com fertilizantes são variáveis, dependendo do produto e do local da produção agrícola, girando entre 25% e 40% do custo produtivo total. “Esses impactos são transmitidos até à mesa do consumidor. Nesse sentido, o governo federal acertou ao tentar reduzir a dependência do Brasil das importações de fertilizantes, via Plano Nacional de Fertilizantes”.

Mesmo diante das compras antecipadas em volume maior por parte das importadoras, as vendas ainda não aconteceram, considerando que os produtores rurais, de modo geral, estão esperando pela queda de preços desses insumos.

“O produtor brasileiro já sofreu na última safra com alguns gargalos, como a falta de fertilizantes e alguns defensivos agrícolas. Muitos podem até antecipar essas compras, para segurarem os insumos para a próxima safra (no ciclo de 2022/2023, que começa no mês de julho). Fato é que o aumento significativo dos custos dos insumos tem sido um desafio para os agricultores, que são compensados, em parte, pela alta nos commodities no mercado internacional”, analisou o consultor Thomaz Britze, da Hand M&A.

Mapa dará continuidade à ‘diplomacia dos insumos’
Em nota à Portos e Navios, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) esclareceu que “os esforços do governo brasileiro, aliados à confiança dos principais países fornecedores de fertilizantes no Brasil, demonstram efeitos e os volumes importados de fertilizantes encontram-se dentro das faixas históricas”.

“O ministro do Mapa, Marcos Montes, deu continuidade à chamada ‘diplomacia dos insumos’, iniciada pela ex-ministra Tereza Cristina, focada no contato com nossos fornecedores usuais de fertilizantes, para que os envios desses produtos se mantenham em volumes similares ou superiores aos recebidos no ano passado”.

Ainda segundo o Ministério da Agricultura, “a ação também busca prospectar e fazer contato com potenciais novos fornecedores para que o Brasil possa ser abastecido, a partir de novas origens, em particular e considerando possíveis impedimentos aos produtos originários da Rússia e da Bielorrússia, visando reduzir o grau de dependência do Brasil de aproximadamente 85% da importação de fertilizantes”.

“É preciso destacar que a compra efetiva de fertilizantes é uma operação comercial, realizada pela iniciativa privada. O trabalho de diálogo do Mapa, com tradicionais fornecedores ou potenciais parceiros desses insumos, visa trabalhar esses mercados a fim de criar um ambiente que favoreça as relações comerciais entre os privados.”

Fonte: Revista Portos e Navios