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Na Mídia - 12/02/25

Ebin é alternativa para mercado de afretamentos. Por Fabrine Raupp Hartog Soares e João Pedro Riff Goulart

A regulamentação da Empresa Brasileira de Investimento na Navegação (EBN-i ou Ebin) é aguardada pelo setor de navegação desde sua criação pela Lei n.º 14.301/2022, conhecida como BR do Mar. Espera-se que essa regulamentação ocorra em breve por meio da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ), com a revisão das Resoluções Normativas (RN) n.º 01/2015 e n.º 05/2016.

Após quatro anos de debates no Congresso Nacional, a Lei n.º 14.301/2022, conhecida como “BR do Mar”, foi sancionada em 7 de janeiro de 2022, com o objetivo de estimular a cabotagem no Brasil e promover alterações relevantes em normas fundamentais para o transporte aquaviário, incluindo: (i) a Lei n.º 9.432/1997, que dispõe sobre a ordenação do transporte aquaviário; (ii) a Lei n.º 10.233/2001, que dispõe sobre o transporte aquaviário e cria a ANTAQ; e (iii) a Lei n.º 10.893/ 2004, que dispõe sobre o Adicional ao Frete para a Renovação da Marinha Mercante – AFRMM e o Fundo da Marinha Mercante – FMM.

Dentre as inovações introduzidas pela BR do Mar, a criação da Ebin (art. 2º, XV, da Lei n.º 9.432/1997) se destaca como uma alternativa para ampliação e renovação da frota de embarcações nacionais. Seu modelo permite que empresas proprietárias de embarcações invistam exclusivamente em ativos, sem necessidade de operá-los, facilitando o afretamento de embarcações por Empresas Brasileiras de Navegação (EBN’s), sem que estas precisem realizar altos investimentos em Capital Expenditure (CAPEX). A estrutura da Ebin surge, portanto, como uma solução para a alocação de capital, considerando que o alto custo de aquisição de embarcações foi apontado pelo Senado Federal como a principal barreira para novos players no setor de navegação (Parecer n.º 322, de 2021, do Plenário, do Senado Federal).

Essa estrutura é amplamente utilizada no mercado internacional da aviação. Nesse setor, empresas especializadas, muitas vezes em parceria com bancos e fundos de investimento, adquirem aeronaves comerciais para locação às companhias aéreas, sem envolver-se diretamente na operação dos voos ou na gestão das aeronaves. Esse modelo separa claramente a propriedade do ativo da sua operação, permitindo que as empresas locadoras foquem exclusivamente na gestão patrimonial, enquanto as companhias aéreas direcionam seus esforços para a operação e comercialização dos serviços de transporte. Além de proporcionar maior flexibilidade financeira às operadoras, esse arranjo cria uma barreira de proteção para o ativo, garantindo que diante de eventuais dificuldades financeiras das empresas de aviação não afetem diretamente a propriedade das naves.

A Ebin adota uma abordagem similar para o setor de navegação, permitindo que as embarcações sejam utilizadas sem que empresas de transporte ou apoio tenham que arcar com os custos da sua aquisição. Seu foco é exclusivamente o afretamento a casco nu de embarcações próprias, tendo sua receita proveniente unicamente do aluguel das embarcações, sem envolvimento na operação logística ou na gestão das rotas e tripulações.

Além disso, embarcações adquiridas pela Ebin podem ser financiadas pelo Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante (AFRMM), caso tenham sido construídas no Brasil (art. 19, “j”, Lei n.º 10.893/2004), criando um incentivo direto ao setor.

A lei também permite que os direitos de tonelagem de embarcações em construção contratadas por uma Ebin sejam transferidos onerosamente para as EBN’s, viabilizando o incremento de tonelagem na frota com o objetivo importação temporária da embarcação estrangeira no Regime Especial Brasileiro (REB).

Ademais, a Ebin pode afretar embarcações estrangeiras a tempo em uma proporção de até 200% da tonelagem de porte bruto da embarcação em construção em estaleiro brasileiro, garantindo flexibilidade operacional durante o período de construção.

Embora a BR do Mar não tenha condicionado a utilização das Ebin’s à regulamentação prévia, há uma incerteza quanto à sua operacionalização. Para enfrentar essa insegurança, a ANTAQ abriu processos de revisão das Resoluções Normativas n.º 01/2015 e n.º 05/2016, buscando consolidar as novidades da BR do Mar e definir os procedimentos para cadastro das Ebin’s. A revisão dessas Resoluções está sendo tratada nos Processos Administrativos n.º 50300.011176/2021-13 e n.º 50300.011174/2021-24.

De uma maneira geral, as contribuições do setor em ambos os processos revisionais estão relacionadas a uma paridade de tratamento entre as EBN’s e as Ebin’s, de forma que não haja uma redução drástica de requisitos regulatórios e econômicos para as Ebin’s, desfavorecendo os fretamentos realizados por EBN’s. Por exemplo, estão os pleitos por exigir o registro das Ebin’s não somente para os afretamentos de embarcação estrangeira e para fins de venda dos direitos de tonelagem, mas também para os afretamentos de embarcação nacional.

De mesmo modo, houve contribuições de que as Ebin’s deveriam estar sujeitas às obrigações econômico-fiscais e regulatórias das EBN’s, a fim de garantir que a embarcação está sendo, de fato, construída no Brasil e de que não estaria sendo frustrada a política de proteção de bandeira.

O debate também envolve a inclusão das Ebin’s no Sistema de Fiscalização (SFIS) e a definição de eventuais penalidades regulatórias. Para esse ponto, a setorial de regulação da Agência entendeu não ser necessária a inclusão das Ebin’s no Sistema de Fiscalização – SFIS (Nota Técnica n.º 40/2024/GRN/SRG), mas nada impede que um outro agente regulador estabeleça infrações para as Ebin’s mais voltadas à vocação financeira dessas figuras.

Em suma, a implementação da Ebin representa um avanço significativo para a modernização e expansão da navegação no Brasil, oferecendo um modelo de investimento que reduz barreiras financeiras e promove maior competitividade no setor. No entanto, sua efetiva consolidação ainda depende da regulamentação da ANTAQ, que está em processo de revisão normativa para equilibrar as exigências entre EBN’s e Ebin’s. O debate setorial reflete a necessidade de garantir um ambiente regulatório justo e eficiente, que estimule a renovação da frota sem comprometer a equidade entre os diferentes agentes do mercado. A definição dessas regras será determinante para o sucesso da BR do Mar e para a construção de um setor marítimo mais dinâmico, acessível e alinhado às melhores práticas internacionais.

Fabrine Raupp Hartog Soares e João Pedro Riff Goulart são advogados do escritório Kincaid Mendes Vianna

Fonte: Revista Portos e Navios