unitri

Filtrar Por:

< Voltar

Na Mídia - 07/04/25

Opinião | COP-30: um marco para o clima e a descarbonização do transporte marítimo. Por Camila M. V. Cardoso e Julia T. de Seixas

O setor é responsável por aproximadamente 3% das emissões globais

07/04/2025 | 03h00

A cidade de Belém do Pará se prepara para sediar um dos maiores eventos internacionais já realizados no Norte brasileiro: a 30.ª edição da Conferência das Partes (COP-30). Em meio a especulações sobre hospedagem e infraestrutura, o Brasil e os atores nacionais se organizam para receber esse evento de grande magnitude, que ocorre em momento histórico e simbólico para as discussões sobre mudanças climáticas.

A COP-30 ocorrerá sob os auspícios da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC), um tratado internacional firmado por 195 países na Rio Eco-92. Esta edição marca os 20 anos do Protocolo de Kyoto e os 10 anos da adoção do Acordo de Paris, ambos centrais na governança climática global.

A escolha de Belém como sede é altamente simbólica, uma vez que a região amazônica é considerada o “pulmão do mundo” e desempenha papel crucial na regulação do clima global.

Apesar dos mais de 30 anos da UNFCCC, os efeitos das mudanças climáticas se intensificaram. O início de 2025 foi marcado por eventos extremos, como a ausência de chuvas e sensações térmicas de 60ºC em algumas Regiões do Brasil. Nesse contexto, e na expectativa da COP-30, o presidente designado, André Aranha Corrêa do Lago, emitiu uma carta traçando o tom do Brasil na liderança do evento e convocando a responsabilidade coletiva dos países face à urgência climática.

A carta surge como um sinal de obstinação em meio a um contexto internacional de desvalorização dos efeitos da mudança do clima, postergação de metas e desinvestimentos. No âmbito da UNFCCC, por exemplo, havia o comprometimento dos países de apresentar até 2024 suas novas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) com metas mais ambiciosas de mitigação, ou seja, redução de emissões. A apresentação por apenas um grupo restrito de países foi um balde de água fria para os países comprometidos, entre eles o Brasil, que apresentou sua nova NDC logo no início da COP-29.

A nova meta de mitigação brasileira prevê uma redução de emissões em todos os setores da economia entre 59% e 67% até 2035, com base nos níveis de 2005. O documento prioriza a transição energética e o uso de biocombustíveis, destacando setores como energia, indústria, agricultura, uso da terra e gestão de resíduos.

O transporte marítimo foi inserido na NDC brasileira no setor de energia e, conforme os estudos produzidos, o setor tem mostrado reduções de emissões de gases de efeito estufa (GHG) significativas. Segundo o Relatório Nacional de Inventário de Emissões, a navegação internacional teve queda de 14% nas emissões em 2022, em relação a 2020, enquanto a navegação nacional, incluindo cabotagem e hidrovias interiores, reduziu 4% no mesmo período.

Considerando que o transporte marítimo é responsável por aproximadamente 3% das emissões globais, seu avanço na descarbonização o torna um modelo para outros setores intensivos em energia. E o mercado brasileiro é o palco para essas ações ao se tornar o primeiro país a construir embarcações com propulsão híbrida movidas a etanol.

Nesse contexto, o transporte marítimo vem ganhando espaço nas discussões e negociações realizadas no âmbito das COPs. Durante a COP-29, a Organização Marítima Internacional (IMO) foi incumbida de produzir estudos de metodologias de cálculo de emissões do transporte marítimo internacional. Esse assunto coincide com a agenda da IMO voltada à estratégia de redução de emissões de GHG de embarcações (The 2023 IMO GHG Strategy), que atualmente debate a implementação, a partir de 2027, de penalidades vinculadas às emissões.

Dois principais modelos de penalidades estão em discussão: (i) o GHG Levy, que consiste na tributação de 100% das emissões para gerar fundos reinvestidos em combustíveis de baixa emissão, e (ii) o Mecanismo de Conformidade Flexível, que penalizaria apenas emissões que excedem metas pré-estabelecidas e recompensaria as embarcações que obtiverem sucesso na mitigação de suas emissões.

A implementação de penalidades visa alcançar as metas estabelecidas pela da IMO que, alinhadas com os objetivos da UNFCCC, incluem, especialmente, a redução da intensidade de carbono da navegação internacional de pelo menos 40% até 2030, comparados ao ano de 2008, assim como o aumento do uso de tecnologias e combustíveis de emissões zero ou quase zero em pelo menos 5% com o objetivo de se atingir 10% – da energia usada no transporte marítimo internacional até 2030.

Na COP-30, espera-se que esses estudos sejam apresentados e os debates sobre a descarbonização do setor avancem.

A questão do financiamento acompanha a descarbonização do setor como um desafio crítico. Durante a COP-29, os países concordaram que as nações desenvolvidas devem fornecer US$ 300 bilhões anuais até 2035 para apoiar países em desenvolvimento. Embora esse montante seja inferior aos US$ 1,3 trilhão anuais inicialmente discutidos, o desafio para a COP-30 será assegurar a arrecadação e definir os critérios de alocação desses recursos, tendo a transparência como fator crucial para tais procedimentos.

A COP-30, portanto, representa um momento crucial para o avanço das negociações climáticas, especialmente no que se refere à descarbonização do setor marítimo e ao destravamento do financiamento climático. Ainda que num contexto internacional desfavorável, com o Brasil assumindo papel de liderança e a Amazônia como palco das discussões, há grandes expectativas de que a COP-30 traga bons e concretos resultados.

Opinião por Camila Mendes Vianna Cardoso

Advogada

Julia Touriño de Seixas

Advogada

Fonte: Estadão