Mario Mendonça disse que entidade, que integra delegação brasileira nas discussões do MEPC, busca assegurar que especificidades do segmento no Brasil sejam levadas em conta no texto final e evitem criação de barreiras operacionais
O Syndarma/Abeam avalia que as principais preocupações do apoio marítimo nas discussões das sessões do Comitê de Proteção ao Meio Ambiente Marinho (MEPC) da Organização marítima Internacional (IMO) estão relacionadas às novas medidas técnicas de médio e longo prazo que serão aplicadas, considerando que as diretrizes desenvolvidas, até o momento, não têm abordado as particularidades desse segmento. Um dos objetivos é afastar os riscos de eventuais penalidades prejudicarem a continuidade das operações da frota construída no Brasil. A próxima reunião do comitê está prevista para 2025, precedidas por duas sessões interseccionais.
Uma das preocupações das empresas brasileiras do apoio marítimo é o tempo de implementação dessas medidas para esse segmento, já que as regras continuam a ser escritas, podendo impactar negativamente a frota existente, caso não sejam econômica e tecnicamente viáveis as possíveis alterações. O argumento é que, como as atividades de apoio marítimo no Brasil têm características distintas daquelas realizadas em outros lugares do mundo, em virtude da grande distância das bacias petrolíferas em relação à costa e às bases de apoio offshore, há uma longa permanência na área de operação e, consequentemente, um aumento significativo de consumo de combustível e de emissão de gases de efeito estufa (GEE).
Em entrevista à Portos e Navios, o comandante Mario Mendonça, assessor do Sindicato Nacional das Empresas de Navegação Marítima (Syndarma) e da Associação Brasileira das Empresas de Apoio Marítimo (Abeam), disse que foi apresentada uma proposta com potencial de trazer uma precisão maior ao Greenhouse Gas Fuel Indicator (GFI), garantindo que esse indicador possa reflitir as métricas operacionais das embarcações de apoio marítimo brasileiras.
“Estamos ainda na fase de desenvolvimento da norma internacional (…). Temos contribuído com conhecimento técnico para que essa norma funcione como uma ferramenta eficaz para o alcance das metas de redução de emissões, sem comprometer a viabilidade da navegação e da frota brasileira de embarcações de apoio marítimo”, afirmou. Mendonça destacou que as embarcações em operação em águas jurisdicionais brasileiras (AJB) são modernas e já utilizam sistemas híbridos com emprego de baterias e propulsores elétricos.
Confira abaixo a entrevista do assessor especial do Syndarma/Abeam à Portos e Navios:
Portos e Navios: Após as últimas reuniões do MEPC-IMO, em setembro, quais são as questões que ainda precisam ser decididas, em especial aquelas que são motivo de preocupação dos armadores no Brasil?
Comte. Mario Mendonça: A principal preocupação para o apoio marítimo brasileiro é a forma como as novas medidas técnicas de longo e médio prazo serão aplicadas, considerando que até agora as diretrizes desenvolvidas não têm abordado as particularidades desse segmento. Essa lacuna levanta dúvidas quanto à acurácia e ao tempo de implementação dessas medidas no setor do apoio marítimo, já que as “regras do jogo” continuam a ser escritas e ajustadas, podendo impactar negativamente a frota existente, caso não sejam econômica e tecnicamente viáveis as possíveis alterações.
As embarcações em operação nas Águas Jurisdicionais Brasileiras são modernas, usam sistemas híbridos com emprego de baterias e propulsores elétricos. Mesmo assim, poderão estar sujeitas a penalidades pecuniárias, colocando em risco a continuidade das operações da frota construída no Brasil.
O Syndarma/Abeam tem acompanhado e contribuído ativamente para a discussão nas Sessões do Comitê de Proteção ao Meio Ambiente Marinho da IMO (MEPC). Na última reunião intersessional foi apresentada a proposta de sinergia ao Greenhouse Gas Fuel Indicator (GFI), através de uma ferramenta de validação, denominada Energy Operational Index (EOI) nas diretrizes propostas, o que poderia trazer uma precisão maior ao GFI, garantindo que ele reflita as métricas operacionais das embarcações de Apoio Marítimo brasileiras.
A minuta do novo Capítulo 5 do Anexo VI da MARPOL também reflete essa preocupação, pois há a possibilidade de validação via sinergia, ainda em discussão. Entretanto, o texto relacionado à aplicação desse capítulo permanece em aberto e espera-se que seja revisado e discutido na próxima reunião intersessional marcada para fevereiro de 2025.
Portos e Navios: Quanto ao Brasil, quais são as propostas para que as regras internacionais possam ser cumpridas ou ajustadas à realidade da navegação brasileira?
Mendonça: Estamos ainda na fase de desenvolvimento da norma internacional, e o Syndarma/Abeam, através de sua representação na delegação brasileira, tem contribuído com conhecimento técnico para que essa norma funcione como uma ferramenta eficaz para o alcance das metas de redução de emissões, sem comprometer a viabilidade da navegação e da frota brasileira de embarcações de apoio marítimo.
Este ano, o Syndarma/Abeam atualizou o Estudo de Emissões do setor de apoio marítimo brasileiro, realizado em 2022. O estudo contou com a participação de algumas associadas, que forneceram dados relacionados às emissões das embarcações, considerando diferentes modos de operação, como navegando, bordejando, em posicionamento dinâmico (DP), atracado e fundeado. O intuito do estudo é compreender e acompanhar as condições reais de operação das embarcações com especial atenção às peculiaridades das operações na costa brasileira, permitindo uma abordagem mais precisa na elaboração das diretrizes.
A atuação do Syndarma/Abeam busca assegurar que as especificidades do apoio marítimo brasileiro sejam devidamente consideradas, evitando que as diretrizes internacionais se transformem em barreiras que dificultem a operação e o desenvolvimento sustentável dessa atividade essencial para o país.
As atividades de apoio marítimo no Brasil têm características distintas daquelas realizadas em outros lugares do mundo, em virtude da grande distância das bacias petrolíferas em relação à costa e às bases de apoio, o que implica em uma longa permanência na área de operação e, em consequência, um aumento significativo de consumo de combustível e de emissão de gases de efeito estufa.
Em último caso, as regras internacionais poderão ser adaptadas à realidade brasileira. Isto está previsto no Art.19 do capítulo 4 do Anexo VI da Convenção Marpol.
Anexo VI – Capítulo 4 – Regras sobre Eficiência Energética para Navios Regra 19 – Aplicação
2. As disposições deste capítulo não deverão se aplicar a navios engajados exclusivamente em viagens em águas sujeitas à soberania ou jurisdição do Estado cuja bandeira o navio está autorizado a arvorar. No entanto, cada Parte deve assegurar, pela adoção de medidas adequadas, que esses navios foram construídos e atuam de forma coerente com o Capítulo 4, na medida do razoável e praticável.
Portos e Navios: Olhando para as características da frota brasileira, quais são hoje as soluções factíveis para uma maior redução de emissões?
Mendonça: Em geral, as embarcações de apoio marítimo apresentam um espaço físico limitado para a instalação de novos equipamentos, tanto em termos de área disponível quanto de restrição de peso. Frente a essas limitações, algumas iniciativas têm se destacado, como o uso de combustíveis mais sustentáveis, o emprego de novos sistemas antiincrustantes, a manutenção regular de limpeza de casco para reduzir o arrasto, a adoção da velocidade econômica sempre que possível, seguro e viável, e a hibridização com o uso de baterias. No entanto, há também um crescente interesse em soluções inovadoras, que combinam modernas metodologias e tecnologias, visando otimizar a eficiência energética.
É essencial que todas as tecnologias sejam avaliadas quanto ao risco de implementação no setor de apoio marítimo, considerando, em especial, eventual impacto sobre a manobrabilidade, particularmente nas operações que dependem do sistema de DP. Este sistema, baseado no princípio da redundância, é projetado para manter o posicionamento do navio mesmo no pior caso de falha, priorizando a segurança.
A configuração do sistema DP das embarcações de Apoio Marítimo foi desenvolvida com foco na redundância e segurança, o que implica o uso de múltiplos geradores em baixa carga. Esse arranjo, embora seguro, pode resultar em um consumo de combustível elevado, já que a eficiência nesse sistema é priorizada sob o aspecto da segurança e não das emissões. O desafio, portanto, está em alinhar a redução de consumo de combustível e emissões com a robustez exigida pelo sistema DP, de forma que a sustentabilidade e a segurança caminhem juntas.
Portos e Navios: Com as tecnologias, combustíveis e infraestrutura de abastecimento atualmente disponíveis, quais os limites para as embarcações se aproximarem da redução total de emissões (Net Zero)?
Mendonça: A aproximação das embarcações ao Net Zero enfrenta uma série de limitações tecnológicas, operacionais e estruturais. Embora combustíveis alternativos mais limpos, como os biocombustíveis e, em menor escala, o metanol, GNL, hidrogênio e a amônia sejam objeto de estudos, há uma grande preocupação quanto à segurança e à densidade energética volumétrica de algum desses combustíveis. Deve-se considerar ainda que a infraestrutura de abastecimento para esses combustíveis ainda é precária ou até mesmo inexistente em várias regiões. Além disso, a maioria das embarcações foi projetada com sistemas de propulsão que não são facilmente adaptáveis a tecnologias de emissão zero sem extensas modificações, o que, além de custoso, exige tempo e planejamento cuidadoso.
A hibridização por baterias, por exemplo, tem se mostrado promissora em certas operações, mas ainda enfrenta desafios para ser aplicada em larga escala, especialmente em embarcações de apoio marítimo, onde o espaço e a capacidade de carga são limitados e onde o sistema de redundância, fundamental para a segurança do posicionamento dinâmico, demanda múltiplos geradores operando em baixa carga, o que eleva o consumo de combustível. Dessa forma, as soluções aplicáveis hoje, embora reduzam as emissões, não conseguem eliminá-las por completo, devido às exigências de operação e segurança características do setor.
Além das limitações tecnológicas, a transição para o Net Zero exige uma infraestrutura de suporte global e confiável, tanto para o abastecimento de combustíveis de baixo carbono quanto para as adaptações de infraestrutura portuária que permitam o uso seguro e eficiente desses combustíveis. Em paralelo, o desenvolvimento de soluções verdadeiramente neutras em carbono, como o uso de combustíveis sintéticos ou tecnologias de captura de carbono a bordo, ainda estão em fases experimentais e precisam de tempo para alcançar maturidade e viabilidade econômica.
Enquanto avanços significativos estão sendo feitos, os limites atuais em termos de tecnologia, segurança operacional e infraestrutura indicam que o Net Zero para o setor marítimo permanece, no curto prazo, um objetivo desafiador.
Portos e Navios: Quais as maiores dificuldades para se chegar a um consenso sobre os temas técnicos e econômicos? O quanto esse tempo para decisão, até abril de 2025, é considerado curto?
Mendonça: Chegar a um consenso sobre os temas técnicos e econômicos relacionados à redução de emissões no setor marítimo é uma tarefa complexa, sobretudo quando se trata de integrar as necessidades e particularidades de setores diversos, como o apoio marítimo. A necessidade de adaptação é reconhecida por todos os envolvidos, e o Apoio Marítimo brasileiro está ciente de que também deverá, em algum momento, ajustar suas operações à ordem mundial. Todavia, é certo que o prazo para implementação, que se estende até abril de 2025, é curto para um conjunto de medidas ambiciosas e técnicas.
Essa limitação de tempo se torna ainda mais desafiadora quando se observa a realidade de uma frota diversificada que, além de operar em regiões com infraestrutura limitada para combustíveis alternativos, depende de tecnologias de redundância de segurança, como o sistema de posicionamento dinâmico. Implementar soluções para reduzir emissões, mantendo o nível de segurança exigido, requer estudos minuciosos e planejamento específico, e essas adaptações demandam um tempo significativo para serem executadas adequadamente.
Outro ponto crítico é a necessidade do alinhamento econômico que considere os custos elevados de adaptação, uma vez que as tecnologias e combustíveis de baixo carbono ainda não são amplamente acessíveis, seja em termos de preço ou infraestrutura de abastecimento. Esse panorama exige que haja negociações para equilibrar a viabilidade econômica e o comprometimento ambiental, pois qualquer avanço que comprometa a segurança ou onere excessivamente o setor pode se tornar uma barreira à implementação efetiva.
Assim, embora abril de 2025 seja uma meta estabelecida, as partes envolvidas precisam avaliar cuidadosamente como equilibrar urgência e viabilidade para que as diretrizes não se tornem inviáveis para setores como o apoio marítimo brasileiro.
Fonte: Portos e Navios